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Gestão de pessoas em uma rede hospitalar: como foi se adaptar em meio a uma pandemia?

Em março de 2020 foi declarada a pandemia de COVID-19 e, diante disso, foi necessário que organizações do mundo inteiro pensassem em ações para o enfrentamento do vírus e para se adaptar à nova realidade de trabalho remoto. 


Imagine como todas essas mudanças foram ainda mais difíceis para os colaboradores de hospitais. A área de gestão de pessoas teria, a partir dali, um grande caminho pela frente.


Neste artigo, vamos falar um pouco sobre como foi essa realidade para os funcionários do Hospital Israelita Albert Einstein, que mesmo antes de decretada a pandemia, já acompanhava de perto o que rolava em outros países e tentava aprender com seus processos.

O primeiro paciente…


Em fevereiro de 2020, o hospital recebeu o seu primeiro paciente diagnosticado com COVID e, no mês seguinte, após decretada a pandemia pela OMS, suas lideranças se reuniram para pensar coletivamente o que eles tinham em mãos naquele momento.


“O que nós temos? Não sabemos nenhuma das respostas. Então fomos para o quadro escrever e elaborar as perguntas: que perguntas nós temos? O que pode acontecer? Por mais clichê que isso possa parecer, nós ficamos das 9 da manhã às 5 da tarde escrevendo perguntas e possibilidades, lá em março de 2020.” - Simone Azevedo, Diretora de Desenvolvimento e Educação Corporativa no Hospital Israelita Albert Einstein.


Com o novo cenário que surgia no mundo todo, era claro que não se podia mais usar os processos da época para realizar a contratação de novos funcionários. Tudo era presencial, as provas, o processo seletivo, e estávamos vivendo um momento de isolamento social.


A partir daí, foi iniciada uma experimentação já no processo seletivo, que foi acelerado para um modelo totalmente digital. A equipe de gestão de pessoas ficou responsável por encabeçar esses experimentos, que escorreram para os processos de onboarding e treinamento, sempre buscando se adaptar à nova realidade.


À época, Simone afirma, todos estavam cientes que o protocolo seguido num dia, talvez já não serviria mais no dia seguinte, e que o contexto era esse: adaptabilidade.


É claro que tantas mudanças vão, naturalmente, gerar resistências. Afinal, vivia-se um momento delicado, onde qualquer impacto organizacional mexia muito com a vida das pessoas.


Encontrar as respostas certas (e as perguntas também)


“Buscar respostas para dá-las no tempo que as pessoas querem é muito difícil. As pessoas querem as respostas muito rápido, o tempo todo, e a gente não tem essas respostas. E aí, entra o questionamento: como vamos nos adaptar para atender ou cuidar desses anseios, acolher essas dores?” - Karen Monterlei, professora convidada no Hospital Israelita Albert Einstein e fundadora da Humanecer.


Carlos Felippe Cardoso, co-founder da K21, afirma já ter ouvido várias vezes que a área de gestão de pessoas “é uma área difícil, é uma área muito processual”, mas a realidade é que não existe plano perfeito, o que existe é muita adaptabilidade. Apesar de ser uma área cheia de processos, que envolve uma série de regulamentações, o grande desafio é justamente se adaptar rapidamente às mudanças. 


Trabalhando no olho do furacão


“A realidade sempre pega seu plano e dá um murro na cara dele”, já dizia o filósofo - e lutador - Mike Tyson. E como seria então, viver essas mudanças estando no vértice do furacão? Foi o que questionou CFC à Simone Azevedo.



Sem sombra de dúvidas, é um exercício para a própria área de recursos humanos e gestão de pessoas. Embora seja uma realidade de alta complexidade, também existe um modelo de voltar ao padrão anterior, à zona de conforto e segurança. O ano de 2020 nos provocou e continua provocando para buscar e adaptar as soluções de acordo com a situação. 


No negócio da saúde eu posso ter diferentes cenários dentro da mesma organização: posso zelar e ser orientada por processos, mas também posso abrir mão de certos processos e burocracias para conseguir dar a resposta dentro do tempo que a demanda exige. 


Imagino que esse tenha sido um dos grandes responsáveis pelas noites mal dormidas de vários profissionais de recursos humanos, explica Simone.


A tecnologia como meio


Atualmente, o Hospital Israelita Albert Einstein é uma referência em telemedicina em todo o Brasil, um fato que muda todo o processo e relacionamento com o paciente. Mas, para que isso funcionasse, foi necessária uma área de pessoas que viabilizasse toda uma linha de negócios nova.


Aqui, é fundamental reforçar que a tecnologia deve ser, de fato, o meio, e a premissa de ter a pessoa como centro desse cuidar deve se manter, para que a relação com o paciente não seja afetada e nem perca em qualidade. 


A pandemia, sem sombra de dúvidas, criou um cenário onde a abertura global para a telemedicina era a principal alternativa. E, diante disso, quando se fala em gestão de pessoas, não só nessa frente, mas em toda a transformação digital, estamos necessariamente envolvendo os desafios políticos, de gestão e atração de pessoas, que demandam desses profissionais novas competências - que os tornem aptos  a lidar com tantas mudanças.


“Nós, em oito dias, fizemos toda a transição de mais de 7 mil alunos do presencial para o online. Então, usar a tecnologia como meio, mantendo a qualidade do serviço prestado, é uma preocupação genuína da nossa transformação.” - Simone Azevedo

A transformação é digital, mas a conexão é humana


Quando se olha o Einstein pela perspectiva da evolução do negócio, do desenvolvimento das pessoas e em como lidar com gente em meio a uma pandemia, considerando também seu setor de ensino, são várias as experiências que transitam no meio de um negócio, e é a área de pessoas que suporta tudo isso - acompanhando, orientando e acolhendo.


Mas como funciona toda a complexidade desse processo em meio a pandemia, a transformação e evolução de negócios? Simone responde trazendo à tona o cenário do hospital:


“Eu tenho um cenário onde se muda o processo até mesmo no sentido da assistência, onde se faz um novo tipo de parametrização do profissional - que de certa forma estabelece uma outra relação. Então como a gente resgata isso? Quando a gente se torna complexo demais, a gente se distancia e não consegue achar soluções que são simples.


Não dá pra resolver tudo só com a tecnologia pela tecnologia. É preciso ter uma abordagem e uma metodologia de aprendizagem, afinal, tem coisas que eu posso fazer via tecnologia e tem outras que eu preciso testar a aplicabilidade.”


O que tem sido feito no hospital, desde março de 2020, é um trabalho com ambientes mais realísticos, mas trazendo esse cenário com estações práticas, fazendo uma supervisão local, onde esses profissionais têm acompanhamento de outros mais experientes.


Ao trabalhar essa questão da transformação e da tecnologia é preciso voltar o olhar para o dia a dia e pensar “o que eu posso simplificar?”. Essa orientação da tecnologia e da transformação tem que aproximar e não distanciar e gerar uma complexidade. 


É fundamental conseguir aplicar e testar soluções e não ficar só nos planos. E é isso o que vem sendo refletido, pensado e aprendido pelas lideranças do Albert Einstein ao longo desse percurso.


Durante a conversa que rolou no episódio número 2 do quadro Xadrez Corporativo, do podcast Love the Problem, CFC usa a fala de Simone sobre trabalhar não em prol da tecnologia apenas, mas do resultado buscado e da humanização, como gancho para questionar nossa criação em silos e departamentos. E pergunta: 


Como foi a adaptação para forjar uma nova cultura a força dentro desse novo cenário gerado pela pandemia? Como foi esse processo que não é só digital? É também um aprendizado de ouvir o outro com escuta ativa? Como está sendo esse processo?


Ouça o episódio completo:


Estamos olhando para isso como uma jornada de agilidade, e buscando encontrar na nossa história como organização, quais elementos que nos aproximam ao longo da história do colaborador. O que fazemos antes mesmo de ir para essa questão mais estrutural e de organização das pessoas.


Nossa organização nasceu de um sonho idealizado por uma comunidade, onde se fala de uma colaboração que, de fato, ocorreu e ocorre, onde se fala de valores estabelecidos, de diferentes contribuições e que tem valores humanitários muito fortes. 


Então, começamos a buscar um pouco dentro dessa história e dessa cultura de inconformismo muito impregnada nos profissionais, olhando para isso para conseguir fazer essa mobilização e esse entendimento interno. 


Não gostamos de adotar medidas porque está na moda ou porque todo mundo está falando a respeito. A gente quer entender o que é, como traz para o negócio, quem a gente envolve, o porquê trazer, etc.


Quando você fala dos silos, você se dá conta de um desafio onde é preciso reconfigurar o seu modelo de trabalho. Então, como toda organização, é preciso colocar a conversa na mesa, todos os desafios, voltar novamente para a essência e se perguntar qual o seu objetivo e onde estão os conhecimentos necessários para atingir esse objetivo? Quem são os atores importantes desse processo? E trabalhar isso dentro da organização, principalmente com as lideranças. 


O que tem que estar a frente disso tudo é o objetivo que queremos atingir e, com isso, pode ser que o protagonismo tenha uma rotação, no sentido da liderança e do conhecimento que a gente precisa para resolver a questão naquele momento.


Gestão de pessoas: se movimentando pelo propósito


No Albert Einstein todos se movimentam muito pela questão do propósito. Diante de um desafio X e um cenário Y, pergunta-se aos colaboradores suas ideias e opiniões. Daí, saem ações maravilhosas de acordo com o cenário e o contexto de quem usa e consome, de quem é, no momento, o colaborador do hospital, o que ele precisa agora.


Afinal, não basta reunir todos numa sala e dizer: "Agora vamos fazer agilidade. Dormimos não ágeis e acordamos ageis”.  Agilidade se faz influenciando, gerando, criando identificação e liderando esse processo.


E o RH ao longo desse processo?


É fundamental repensar o RH nesse processo todo: como multiplicar os comportamentos desejáveis dentro de um cenário desafiador de mais de 16 mil colaboradores? Como engajar as pessoas estando distantes?


A verdade é que não tem nenhuma grande receita, é uma cultura forte, com grande desejo pelo conhecimento e pela vontade de fazer a diferença no sistema de saúde do país, junto de pessoas que se conectam por esses grandes propósitos. 


Além disso, a existência de rituais com a liderança, que se tornam exemplos dentro da organização. Ser um bom líder é uma grande responsabilidade, é entender que há um grande grupo de funcionários diversificados e saber como chegar em cada um deles.


Ou seja, não é uma fórmula, é um conjunto de ações, de visão e comportamento, tanto da área de recursos humanos e gestão de pessoas, quanto da área de desenvolvimento corporativo e também das lideranças.


A saúde física e mental dos colaboradores também é responsabilidade das organizações


Dada a sabida importância da saúde dos colaboradores, é feita à Simone uma pergunta sobre como o hospital lida com isso em tempos tão difíceis.


Como é cuidar da saúde física e mental dos colaboradores do hospital (principalmente dos que estavam na linha de frente, sendo tão pressionados) e equilibrar com tantas mudanças?


O cenário é realmente um cenário de cuidado, a questão da saúde mental e do equilíbrio entre saúde e bem estar sempre foi uma agenda aqui na organização e já era uma prática conduzida aqui dentro que, é claro, foi demandando adaptações. 


No contexto do COVID, por exemplo, nós entramos com programas de apoio e suporte aos profissionais e um outro programa que trazia consciências situacionais, com rodas de conversas, agendas de atendimento e suporte a família e mais.


Olhamos para a situação que foi desenhada na nossa frente para entender o que se mantém e o que é efetivo envolvendo as áreas, os colaboradores e as lideranças das áreas, entendendo o que era preciso ofertar para dar esse suporte.


A beleza do simples


Para finalizar esse papo entre três grandes nomes do mundo corporativo, onde dois são fortes referências da gestão de pessoas, CFC decidiu soltar o verbo e concluir com sua última pergunta: Onde que a gente perdeu a essência do meio do caminho? Que símbolos a gente está querendo forçar?


E a resposta foi na lata, segundo Karen Monterlei: “Se o líder não estiver cuidando de pessoas, ensinando, aprendendo e criando, tem alguma coisa errada.”


Esse cuidar de pessoas, que passa pela questão do exemplo, existe desde muito tempo. Quando a gente fala hoje sobre o líder servidor ou outros assuntos relacionados à liderança, você vê um movimento que trata esses temas como se fossem coisas recentes, mas a verdade é que já existiam há muito tempo. 


Mas quais são os comportamentos necessários para que aquilo que é colocado como um conceito se torne realmente uma prática? É no exemplo, é no dia a dia, é na construção e na cocriação, é na colaboração de todos em torno de um tema.


A liderança é o olhar sobre as pessoas e o cuidado com elas de forma genuína. Eu me interesso verdadeiramente por aquela pessoa. 


Gestão de pessoas: ser ou estar?


A mensagem final deste texto para o profissional de recursos humanos é, na verdade, um questionamento: a gente quer SER ou ESTAR ágil? 


Para a gente ser, a gente tem que mexer e começar por nós mesmos, enquanto profissionais de recursos humanos. Se despir de algumas coisas e talvez, a partir daí, influenciar essas mudanças. A gente precisa optar por ser.


E lembre-se, uma dica bem humanecer para todos vocês: Na dúvida, volte para o simples. Qualquer dúvida que você tiver enquanto estiver construindo algo, volte para o simples, para o essencial, aquilo que nos sustenta genuinamente, que nada mais é que a agilidade que é possível ser feita.